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África para Africanos : Estado Nação
África para Africanos : Estado Nação

Para se entender a África no que diz respeito a sua formação atual de Estado e nação se faz necessário esclarecer as divergências que acerca a trajetória dos países que compõem este vasto continente.

Para Demétrio Magnoli:

“O continente africano esta bipartido em dois conjuntos geopolíticos- África do Norte e África Subsaariana.”

 

Em seu imenso território, é fato que as particularidades de cada região africana trazem consigo particularidades que vão muito além da pobreza e dos problemas geopolíticos. Porém, e interessante salientar que algumas generalizações facilitam um pouco a percepção do processo histórico africano, como por exemplo as suas independências tardias.

Na década de 1940, apenas quatro países possuíam independência. Nas demais regiões, os processos libertadores só vingaram a partir dos anos 60. É evidente, que as lutas pró independência não foram de forma alguma sem derramamento de sangue, muito pelo o contrário. Intensas e longas batalhas foram travadas a fim de expulsar aqueles europeus que ali impuseram seu domínio.

Casos mais graves, sobretudo no que se refere ao atraso para se conquistar plena autonomia podem ser exemplificados nos países como Angola, Moçambique e Cabo Verde. Neste os conflitos em torno da emancipação só findaram no ano de 1975. O que nos chama bastante atenção, é que mesmo após a conquista da independência, permaneceram em muitos destes países africanos, as estruturas herdadas dos europeus. Nas palavras de Demétrio: “O alicerce dos novos Estados africanos foi constituído, quase sempre, pelo aparelho administrativo criado pela colonização européia. No momento das independências, o poder político e militar transferiu-se das antigas metrópoles para as elites nativas urbanas, que instalaram regimes autoritários. Na maior parte das vezes, essas elites representavam um grupo étnico particular, que se apossou do aparelho de Estado e o utilizou para subjugar ou marginalizar as etnias rivais.” A partir daí podemos então perceber o quanto os velhos mecanismos de controle e repressão foram reutilizados e reaproveitados para a manutenção do poder. Singularidades a parte, o fato é que as velhas estruturas facilitaram a permanência de muitos ditadores, estes mesmos africanos.

Um aspecto fundamental para compreender essa heterogeneidade que dificulta a união dos povos africanos como Estado e ou nação, é sem dúvida o papel do Islamismo. Se traçarmos um olhar histórico a respeito de tal tema, poderemos constatar o quanto a expansão árabe influenciou boa parte do continente. Assim se torna mais fácil compreender as distinções feitas por muitos historiadores entre a África do Norte e a região Subsaariana. No que tange a escravidão, observa Magnoli:

“O tráfico de escravos africanos foi conduzido inicialmente pelos Árabes, na orla semi árida do Sahel, através de caravanas transaarianas, e na África Oriental, através de enclaves portuários no Oceano índico. Contudo, o negócio do tráfico experimentou vigoroso crescimento a partir do século XVI, quando se associou à colonização das Ámericas.(...) Ao longo de quase quatro séculos, cerca de 15 milhões de Africanos foram capturados e transferidos por traficantes árabes ou europeus.”

Além de promover o que Demetrio chama de estagnação demográfica, o empreendimento escravista incitavam povos a lutarem entre si em busca de controle e poder, disputando territórios bem como seus habitantes.

No entanto apesar das notáveis diferenças entres regiões africanas, é preciso ter cuidado em certar conceituações, como o caso da “Africa Negra”. Este termo deriva do tempo em que vigoravam as teorias do darwinismo social e pode designar erroneamente uma padronização ou generalização destes povos. Destarte, o que realmente importa, é que mesmo após as pressões britânicas para o fim das praticas escravistas, estas deixaram profundas mazelas nas atuais sociedades africanas, que sem dúvida é um dos muitos fatores que contribuem para a desestruturação do continente. O modelo da economia liberal contribuiu, segundo Paulo Visentini, para a desfuncionalidade dos Estados Africanos. Estados que anteriormente já se encontravam em dificuldades, sobretudo em relação a fome, epidemias e questões sanitárias, passavam agora a desfrutar de autonomia política. Porém nem de longe os problemas herdados muito antes da chegada dos europeus fora resolvido.

Um dos mais graves problemas por que passa o continente africano, é o número alarmante de pessoas infectadas com o vírus HIV. Neste, somam-se quase 30 milhões de pessoas contaminadas, que se concentram principalmete na porção que corresponde a parte subsaariana. Demétrio Magnoli afirma que: “A incapacidade revelada pelos Estados Africanos de combater a pandemia decorre muito mais da ineficiência política e administrativa dos governos que da carência de recursos.” Também nos chama atenção quando tomamos conhecimento que absolutamente todos os países com pior IDH corresponde a porção subsaariana da África, segundo dados da Organização das Nações Unidas. Essas questões jamais poderiam ser explicadas sob uma única causa, e muito menos devido a ocupação européia. Na verdade o continente africano sofre de mazelas por conta de fatores endógenos, internos. Demétrio Magnoli, nos traz uma explicação sobre este aspecto, que vai muito além de questões economicistas ou políticas. Este afirma que:

“As economias africanas encontram-se presas a uma “armadilha da pobreza” formada pelas teias entrelaçadas da baixa produtividade agrícola e das moléstias típicas dos climas quentes. Vastas áreas da África tropical apresentam solos de baixa fertilidade natural, intemperizados por chuvas torrenciais. No domínio climático tropical, que caracteriza grande parte do continente, a irregularidade das precipitações provoca perdas periódicas de safras e instabilidade dos ciclos agrícolas.”

A partir daí, devemos atentar para outros elementos que nos auxiliam a melhor compreender as origens e a perene realidade de carências e miséria, vivenciada pelos africanos ao longo do tempo. Muito além das disputas polícas, existem fatores geográficos que são inerentes a região, pouco debatido e mencionado por cientistas políticos e historiadores.

Sobre as questões referentes ao campo econômico, constatamos que a fragilidade dos Estados é um dos pontos centrais para o fracasso dos africanos como membros de um Estado Nação. Os Estados Africanos não formaram bases sólidas, tendo suas relações de poder bastante instáveis, envolvidas em disputas de clãs ocasionando conflitos em busca de poder. Toda esta instabilidade contribuiu muito para a sua ineficiência  e consequentemente a perda de credibilidade. Para Demétrio Magnoli:

“Não asseguraram as condições gerais indispensáveis para estimular os investimentos produtivos e a expansão do intercambio comercial interno ou externo. Não conseguem erguer os serviços nacionais básicos de educação e saúde. Não conseguem garantir a circulação, em segurança, de pessoas e mercadorias. São ainda menos capazes de implantar as infra estruturas energéticas e rede de transportes e comunicações necessárias para as economias de mercado".

Percebe-se que muitos efeitos da miséria africana derivam da sua ineficiência política, da instabilidade interna e de fatores geográficos, que somado a implantação de estruturas não africanas provocaram enormes prejuízos.

Por fim, a África ainda não resolveu pro si mesma seus greavíssimos problemas de conflitos e guerras étnicas. Podemos mencionar a criação da Organização da Unidade Aficana que visava a estabilização política e desenvolvimento econômico do continente. Criada por aparente boa intenção, para Paulo Visentini, no entanto em um:

“continente tão complexo e com tão gramde números de Estados, durante as quase quatro décadas de sua existência a OUA teve uma aço restrita e deficiente.”

Tendo como base fundamentadora a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, os componentes conhecidos como Estados membros visavam a harmonia nas esferas humanitárias, sociais e principalmente econômica e política. Nesse contexto, é necessário esclarecer alguns pontos. Um deles trata justamente do papel que representava a África no período da Guerra Fria. Se o mundo estava dividido em zonas de influencia, o continente Africano representava uma “arena” onde importantes decisões geopolíticas globais eram tomadas. Para Demetrio Magnoli, a OUA:

“ serviu como um instrumento da fragmentação geopolítica estabelecida pelo imperialismo europeu e pelas elites pós coloniais.”

Magnoli ainda acrescenta o seu pensamento no que diz respeito ao fato desses novos líderes de uma áfrica pós libertação, jamais terem questionados a permanencia das froteiras colonialistas. Ele afirma:

“ A resposta parcial a essa questão é que os líderes africanos representavam elites étnicas cujo poder estava assentado justamente nos Estados existentes, que portanto deviam ser conservados.(...) A África não tinha “fronteiras artificiais” disponíveis para substituir aquelas criadas pelas potencias européias”.

Se por um lado essas fronteiras foram mantidas as custas das tensões internas, do outro, abrir mão das mesmas poderia significar conflitos ainda maiores, que certamente, os governos estatais não estariam dispostos a resolver. Além disso, muitos governantes se mantinha no poder graças a ajuda de potencias estrangeiras. É evidente que seria muito arriscado desagradá-las. Mais do que isso, os novos dirigentes deveriam fazer de tudo que estivesse ao seu alcance para que suas alianças políticas internacionais permanecessem intactas. Então, é óbvio que a contrapartida dos dirigentes africanos para com seus aliados estivesse de acordo com seus projetos econômicos, legitimados por mecanismos políticos Demétrio afirma: “A recompensa das potencias às elites dirigentes africanas consistiu no financiamento externo dos aparelhos administrativos e militares, que assegurou o poder dos regimes políticos e o esmagamento da contestação  interna.” Percebe-se o quanto as relações de poderes estão interligadas, muito próximas aos interesses de grandes dirigentes, e distantes da tão sonhada unidade dos povos africanos.

Por, Rafael Sarmento